quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Diálogo Truncado


- O que você tem hoje?
- Nada não, só estou um pouco triste.
- Triste por quê?
- Ontem minha avó caiu da escada e eu acho que vai demorar um pouco para ela ficar boa.
- Eu não sabia.
- É, foi uma queda e tanto, ela estava distraída e pisou em falso num dos degraus, não sei muito bem como aconteceu, foi muito rápido, acho que ela estava meio sonolenta, devia estar dormindo, levantou pra fazer xixi e pimba! Caiu da escada.
- Que azar!
- Não, não fale azar! Fale que falta de sorte!
- Que falta de sorte da sua avó, hein?
- Sim, que falta de sorte...
- Pois é.

- E você?
- Eu o que?
- Você está bem?
- Acho que estou bem, se não fosse por essa notícia agora.
- Você realmente gosta tanto da minha avó assim?
- Eu nem bem conheço a sua avó.
- Então não fique triste pelo acontecido, você não tem nada a ver com isso.
- É que tenho uma imensa pena das velhinhas que caem de escadas; diga-me uma coisa, ela rolou ou foi se batendo na mesma posição até o último degrau?
- Foi cambaleante, não chegou a dar uma cambalhota inteira, mas se bateu bastante.
- Lamentável.
- E antes de chegar ao último degrau ela gritou: eureca!
- Foi?
- Sim, porque fez uma grande descoberta enquanto sofria o acidente.
- Ela deve ter batido muitas vezes a cabeça e isso deixou seus neurônios funcionando de maneira mais brilhante.
- Pode ser, os médicos não falaram nada a respeito.
- E qual foi a grande descoberta?
- Não sabemos, ela entrou em coma antes de nos dizer.
- É uma pena mesmo, ainda mais sabendo que nos dias de hoje a venda de uma grande descoberta vale muito dinheiro.
- Sim, eu também pensei nisso, acho que este é o maior motivo da minha tristeza.
- Sua família é muito pobre?
- É
- Muito pobre como?
- Dificilmente meu pai se senta à mesa para comer com todo mundo e meu irmão tem muitas namoradas, minha mãe adora assistir as novelas do canal católico, meu avô tem uma coleção de latinhas de refrigerante antigas e minha avó estava pegando as prestações do clube da pré-morte de um cemitério para terceira idade.
- Muito pobre.
- Sim, e a pior de todas é a minha pobreza.
- E qual é?
- Eu escrevo cartas de amor para um antigo namorado que sumiu no mundo.
- E ele as recebe?
- Sim, onde quer que esteja. Ele está juntando inspiração para escrever uma carta-resposta me perdoando.
- O que você fez para precisar se perdoada?
- Quando resolveu ir embora, eu escondi o único mapa que ele tinha.
- E por que ele resolveu ir embora?
- Porque é um crápula que estava apaixonado por uma aeromoça.
- Você é aeromoça?
- Não.
- Bom.
- Mas ele não tinha dinheiro para segui-la de avião, então foi de asa delta.
- Entendo.
- Todo dia eu mando uma carta pra ele, comprei um pombo para voar bem alto e amarei na patinha dele uma espécie de fio que leva uma bolsinha, é lá que eu ponho a mensagem. O pombo sempre vem sem nada amarrado e com a imagem dele nos olhos.
- É um bom pombo.
- Sim, é.
- Espero que sua avó fique bem.
- Eu também
- Agora preciso ir.
- Eu também.
- Então foi muito bom falar com você.
- Igualmente.
- Igualmente.
- Você é sempre assim, de poucas palavras?


"Você não entende que me atirei no abismo do teu coração e me fiz testemunha da mais ingrata verdade. Assim eu me fiz durante a vida toda, me guiando cada vez mais fundo pra queda e quando quis voltar, já era tarde demais, não existia uma corda para a subida, fiquei preso nos laços do mais profundo dos teus sonhos inertes e me perdi feito um anjo caído na imensidão dos teus abraços de despedidas!"
.
- Eu sou um pouco tímido sempre.

Paloma Amorim

5 comentários:

Átila Goyaz disse...

Nossa menino, que isso!
Diálogo perfeito cheio de tramas e detalhes..muito show mesmo!

Tava com saudades das tuas postagens vc nem sabe :)


bjux

Thom Albuquerque disse...

Gostei ^^
muito mesmo.
vamos nessa!
abraço<

Anônimo disse...

Olá, amigo..
Desculpe a ausencia, final de ano , trabalhando por demais, esses dias eu fiquei pensando, e decedi promover a BLOGAGEM COLETIVA ( Contra Violência), faça parte dessa campanha, e vamos fazer a diferença.

Venha comigo, pegue seu selo,
Aguardo você no AUSÊNCIA INSTÁVEL.

Abração.

Átila Goyaz disse...

Saudades...

Simplesmente Outono disse...

Passo para desejar um Natal na magnitude do teu mereciemento.

Desejo ainda que 2010 seja um ano repleto de sonhos realizados, de amizades fortalecidas, de amores vividos.

Permaneço afastada das letras por motivos que indepedem da minha vontade.

"É impressionante a força que as coisas parecem ter quando elas precisam acontecer". Permeada verdade com uma intensidade que jamais pensei suportar.

Deixo-te minhas folhas com o mesmo carinho de sempre ressaltando a saudade do nosso contato.

Simplesmente Outono.